sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Moralidade e nicho cognitivo

A nossa moralidade é composta por um conjunto limitado de elementos cognitivos. A sua organização é fundamental porque é central para o desenrolar da criatividade, sociabilidade e para alicercar a noção de identidade individual. A sua tarefa é instruir logicamente a função cognitiva do indivíduo, tanto ao nível do seu comportamento como do raciocínio.

A organização interna da estrutura moral e sua a relação com a estrutura de estímulos ambiental é determinante para a qualidade da função cognitiva.
Os elementos que a compõem provêm de um processo de selecção. É essa selectividade que prepara o indivíduo para lidar eficazmente com o seu ambiente natural, social e cultural. Só assim, resultante de um processo de aprendizagem permanente, se adequam as suas reacções às solicitações promovidas pela interacção com o seu contexto.

Do ponto de vista cognitivo podemos classificar a moralidade como a estrutura lógica que está no poder. Mas como disse no início a sua amplitude é limitada. A sua composição é o resultado de um processo de compressão* da realidade, através da escolha de certas regularidades que povoam a nossa envolvente e com as quais nos deparamos ao longo da vida. O seu resultado é sempre uma simplificação da estrutura de estímulos ambientais.

São pelo menos três as fontes que alimentam esta construção: as regularidades naturais, as regularidades culturais/sociais e aquelas regularidades que se geram a partir da nossa própria influência.

Esta última fonte sugere, para cada momento da nossa vida, a preexistência de estruturas éticas já formadas que não só condicionam o nosso próprio comportamento como também o comportamento dos outros e da matéria que nos rodeia. Portanto, nós também somos responsáveis pela organização da nossa própria estrutura de estímulos ambientais. No conjunto das relações específicas que se estabelecem entre a dimensão cognitiva interna e a dimenão externa forma-se um nicho cognitivo para cada indivíduo. Ou seja, a construção da nossa estrutura moral e ética também é condicionada, recursivamente, por essa situação.

Este processo de ascensão de certas regularidades ao topo da hierarquia cognitiva demonstra a sua estreita relação com um contexto específico. A nossa moralidade é sempre o resultado de uma trajectória individual, que é única. Essas estruturas foram originadas para responder a situações muito concretas da vida de um indivíduo e de uma comunidade, a sua universalização e essencialização posterior é um fenómeno político e cognitivo que muitas vezes desvirtua a sua função social original.

Toda a moralidade é construída a partir de um nicho ecológico e é apenas adequada a esse nicho.



*Sobre o processo de compressão cognitivo ler o «Quark e o Jaguar», de Murray Gell-Mann

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